terça-feira, 14 de outubro de 2008

Ensaio sobre a solidão (e músicas. e cappuccinos.)

Eu só tinha dormido uma hora durante aquela noite.
E quem tem problemas com sono sabe que dormir pouco é bem pior que não dormir nada.

Bom, o caso é que vários fatores me fizeram entrar no Starbucks, naquela quinta feira extremamente gelada, para matar o tempo antes de enfrentar a faculdade. Pedi educadamente um cappuccino (que, segundo o Wikipedia, se escreve assim mesmo, com dois “p”s), afanei um punhado de saquinhos de açúcar e fui me acomodar confortavelmente em uma das poltronas.
Uma coisa que eu sempre achei engraçado na solidão nesse tipo de lugar é o olhar de pena de cada pessoa acompanhada quando te percebe (tipo: “ohwnnn, pobrezinho... não deve ter nenhum amigo, coitado”) e o olhar de aceitação dos outros solitários (tipo: “é, cara... eu entendo o que você ta passando”). Enquanto alguns te vêem como um alienígena, outros te enxergam como uma alma-irmã, e você simplesmente não sabe qual olhar é o pior.
Portanto, me hospedei em uma poltrona entre um casal de meia idade e uma garota que provavelmente havia deixado para estudar toda a matéria de um ano alguns minutos antes da prova. Adocei meu cappuccino com uns 20 saches de açúcar e deixei meu corpo se jogar espalhafatosamente na poltrona, com o copo entre as duas mãos, me entretendo apenas com a música ambiente e meus próprios - e inúteis - pensamentos. Enquanto isso, o casal de meia idade conversava animadamente, a garota folheava uma gigantesca apostila e mais uma dúzia de pessoas viviam suas próprias vidas. Homens de negócio liam seus jornais, mulheres bem vestidas mexiam em seus laptops, senhores buscavam abrigo contra o frio e garotos riam alto de suas próprias piadas.

Eu mesmo já tava na metade do meu café da manhã quando uma música começou a tocar. Não me pergunte que música era porque eu não faço a menor idéia. Era simples, só uns 4 acordes no piano, mas era o crescente da música que importava. Sabe, eu sempre gostei do impacto que causa um crescente numa música. Uma melodia que começa calma, como quem não quer nada... começa a aumentar discretamente a intensidade, adicionando mais música, adicionando mais emoção... até que explode, deixando a ingenuidade do começo no passado.
Mas a parte técnica disso tudo é o que menos importa. O que importa é o que essa música te faz sentir, o que passa pela sua cabeça enquanto a sua emoção vai crescendo no mesmo compasso da a música. Porque naquele momento, sentado num Starbuks com pouco mais que uma dúzia de pessoas, tudo ao meu redor ficou em silêncio. Só me existia aquela música.
Não, não me entenda mal... o casal de meia idade continuava conversando. A garota continuava lendo sua imensa apostila. Os homens bem vestidos continuavam mexendo em seus laptops, as mulheres de negócio continuavam lendo seus jornais, os senhores ainda esfregavam as mãos contra o frio e os garotos ainda riam alto de suas piadas sem-graça. Mas todo som parecia mais baixo, como se eu tivesse diminuído o som na TV e aumentado o som do rádio. Como aquelas pessoas podiam continuar tão indiferentes àquela música? Como aquele momento podia estar sendo tão único apenas PARA MIM?
Quer dizer, tudo é tão imediatista, tão feito com a pressa de acabar. Nós comemos apenas por comer, nós bebemos apenas por beber. Lemos querendo chegar logo ao fim do livro, assistimos um filme apenas para saber o que acontece com o personagem principal. Nós começamos cada ação já salivando pelo seu final. Parecemos máquinas programadas apenas para a conclusão, o “durante” não importa mais. Ninguém mais aproveita o momento.

E foi aí que uma coisa me ocorreu. Cada pessoa sentada ao meu redor aproveitava o seu próprio momento, cada um à sua própria maneira. Enquanto a vida acontecia lá fora, para eles tudo o que existia eram seus cafés, suas conversas, seus jornais e seus laptops. E quer saber: quem poderia culpá-los?

Então a música acabou, assim como meu cappuccino.
Levantei, arrumei meu casaco amarrotado, caminhei até a porta e senti o vento gelado bater no meu rosto.
A música que acabara de tocar já fugia da minha memória, na certeza de que eu nunca mais a escutaria de novo, como aquela garota bonita que você vê no metrô e sabe que nunca mais encontrará.
E ainda assim eu sabia que não esqueceria aquela música tão cedo.

Enfiei as mãos no bolso, esqueci do frio, afastei o sono e continuei andando.
Afinal, eu tinha uma vida para viver...

7 comentários:

Renatinha disse...

Engraçado nem lembrar direito como é a música que te inspirou a fazer um post tããããão bonito e inspirado né?!
Uma das coisas que mais gosto de fazer quando estou sozinha é aboservar as pessoas a minha voltae imaginar quem são elas, etc. Mas ninguém para mais pra olhar em volta quase, quanto mais pra ouvir uma música.

Mas a boa notícia é que a música pode tocar de novo...! Lembra daquela que gostamos e já ouvimos 2 vezes?

Amei o texto... De verdade... To pensando em não ir mais com você de quinta-feira... assim você pode fiar sozinho com seus pensamentos.

Silêncio Faz Bem disse...

Buuuuaaaaaaaaa......(!!)

Definitivamente adorei...
Comecei à ler e já de imediato me perguntei:
-Prum blog de musica que que tem haver uma manhã e um "capputino"?
De repente me deparei com o fato da musica ambiente estar ali, definitivamente encutida no texto.
No final da postagem eu tava chorando [risos]...
Não que eu seja tão emotivo assim.. mas eu não aguento!

Faz assim: Entra no meu outro blog: www.restosdeboi.blogspot.com lá eu do um de emo de vez em quando!!
Acho que ele é um blog esquecido pelo povão mas não por mim; vou atualizalo ainda hoje.

[bjs nas crianças?!][

Silêncio Faz Bem disse...

acho que vcs dois deveriam falar sobre uma banda que é o máximo!
Thirty (30) Seconds to mars
Definitivamente eu não consigo parar de ouvir as musicas deles, tomaram conta da minha alma.
Eu recomendo as musicas: the kill , fron yesterday e Abeautiful Lie .


Bjs

Tchelo disse...

Mto bom, mto bom.

Eu sei q o comentario é sem-graça, mas enfim, mto bom, mto bom...

Bonie disse...

Uau.

É o tipo do texto que eu gostaria de ter escrito, sabe?

Adoro ficar sozinha pra perceber esse tipo de coisas. É uma delícia parar pra ficar ouvindo os acordes da música e se perder em pensamentos... ou não pensar em nada, simplesmente.

Digno! :]

Douglas Funny disse...

ta aí... tem horas q simplesmente não queremos q a música chege no fim, ao mesmo tempo q assistimos um filme torcendo pelo final... estranho... ñão lembro de ter parado para uma análise tão complexa... hehehehehe... pesar de ser do meu estilo.

mas música é música, é o q sempre digo... ou não.

bjoka nas crianças!!

majv disse...

cara que bacana esse texto. sei lá, sempre curto essas paradas filosóficas que tu escreve, mas eu adoro cappuccino e senti uma ligação total. vou ler os livros mais devagar agora. xP