domingo, 31 de julho de 2011

Adeus

Por Renatinha

Perder alguém não é fácil.
Eu já tinha perdido algumas pessoas, mas nunca as vi partir assim, na minha frente.

Não existe nada que apague essa sensação.

Estou aqui apenas para agradecer aquele que partiu por ter sido meu pai, meu amigo, meu porto seguro e até minha fonte de briguinhas sem sentido.

Quando eu já tinha aprendido a viver sem um pai, você apareceu na minha vida, dando mais significado para a frase de que pai é quem cria e não quem gera.

Eu não achei que fosse te perder tão cedo.

Agradeço ao destino, a Deus, o que seja, por ter permitido que eu tenha segurado sua mão nos seus últimos minutos aqui na Terra.

Passei minha vida me referindo a você como padrasto, mas só agora vejo como isso foi uma burrice. Você é e sempre será meu pai.

Obrigada por tudo.
Vou sentir sua falta.
Te amo.

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segunda-feira, 11 de julho de 2011

Maus


Por Brancatelli.

"Toda palavra é como uma mácula desnecessária no silêncio e no nada."

A frase, do escritor irlandês Samuel Beckett, é citada em uma conversa entre o desenhista Art Spiegelman e seu psiquiatra, cena real presente na sua HQ biográfica Maus ("ratos", em alemão), publicada em 1991.

A obra, inicialmente criada para contar a história de como seu pai, Vladek Spiegelman, sobreviveu aos horrores da Segunda Guerra e ao campo de Auschwitz, acabou se transformando num relato do difícil relacionamento entre pai e filho.
Mais que isso, em um acerto de contas do autor consigo mesmo e com seu passado conturbado.

Mesmo retratando os judeus como ratos e os alemães como gatos, Spiegelman humaniza seus personagens de uma maneira extremamente sóbria. Do soldado nazista ao povo polonês (retratado como porcos), dos informantes traidores até seu próprio pai, o estereótipo do judeu mesquinho, pão-duro e racista.
Não existem heróis perfeitos, o que existe são seres-humanos, tão imperfeitos e cheios de falhas que é impossível não reconhecermos a nós mesmos.

Em Maus não existe a idealização.
Apenas a realidade.

Alternando a história de seu pai à sua própria, Art tenta justificar a difícil figura do pai, moldada pela Guerra, pela perseguição, pelas perdas e pelo suicídio de sua esposa.
Desse modo, Art acaba tentando justificar suas próprias ações. Em certo momento, o autor percebe que, no fundo, ele sempre competia com a lembrança de seu irmão, morto na Guerra antes mesmo de seu nascimento, e que tudo o que ele carregava disso era culpa. Culpa por não ter passado pelo que seus pais passaram, culpa por ter sobrevivido ao seu irmão, culpa por não conseguir entender o sofrimento de se estar preso em um campo de concentração, de passar fome e estar às portas da morte, culpa por se sentir explorando a tragédia do Holocausto em sua obra, culpa pelo seu próprio sucesso.
Enquanto relata a história de seu pai, Art liberta todos seus traumas psicológicos.

"Toda palavra é como uma mácula desnecessária no silêncio e no nada."

Tentar definir o horror do Holocausto nazista é uma tarefa impossível, mesmo para quem sentiu suas marcas na própria pele. Pior ainda seria tentar entendê-lo.
Na conversa onde essa frase é citada, Art é questionado por seu psiquiatra do porque de existir tantas obras sobre o Holocausto, se ainda assim as pessoas não mudaram.
Maus não tenta explicar o que aconteceu, e tão pouco justificar. A obra apenas mostra, em uma leitura pesada e perturbadora, as profundas cicatrizes que tudo aquilo deixou em seus sobreviventes, seja nos diretos quanto nos indiretos.
Não importa os culpados, apenas as vítimas.

A ilimitada maldade humana não é algo compreensível.
E qualquer tentativa de representá-la acaba sendo apenas uma mácula desnecessária no silêncio, que por si só já diz muito mais.

Mas conseguir transformá-la em arte?
Isso sim é admirável.

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