quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Chico


Por Brancatelli

Expectativas altas, boatos, opiniões intelectualóides, críticas abalizadas, comparações com o passado, notícias em todos os jornais, revistas e sites..

Um novo lançamento musical do Chico Buarque nunca é apenas um lançamento.
É um verdadeiro evento nacional.

E agora, 5 anos após o lançamento do álbum Carioca, ocupados pela criação do seu quarto romance - o festejado Leite Derramado - e pelo completo desprendimento musical, o compositor lança seu novo e breve disco, o primeiro de sua carreira a se chamar apenas Chico.
Com toda a pompa descrita la em cima, como não podia deixar de ser.

O disco é minimalista em seu nome, músicas, instrumentação e duração (pouco mais de 30 minutos).
Mas conta com canções que podem perfeitamente ser incluídas entre as melhores do músico. Um verdadeiro apanhado de todas suas fases, desde os primeiros sambas até as músicas mais difíceis dos últimos trabalhos.
Um passeio por toda sua carreira.

Chico parece ter alguns temas centrais.
Primeiro é óbvia a influência do seu romance com a cantora Thais Gulin, 36 anos mais nova. A relação entre um homem mais velho e uma garota mais nova é o foco de duas das melhores músicas do disco, o blues "Essa Pequena" e a faixa "Tipo um Baião", que é, tipo assim, um baião. O tema é percebido em "Se Eu Soubesse", com participação da própria Thais Gulin. E o peso da idade também está presente na bem-humorada e nostálgica "Barafunda".
Outro tema, como apontado pelo próprio Chico no making of do álbum (clica la, vale muito a pena), é a própria música. "Rubato" é uma brincadeira sobre uma composição roubada por outros músicos, que colocam a letra que mais lhes convém. "Nina" é uma valsa russa falando da própria valsa russa, assim como a ja citada "Tipo um Baião", com um dos mais lindos versos criados pelo Chico: "Meu coração / Que você sem pensar / Ora brinca de inflar / Ora esmaga / Igual que nem / Fole de acordeão / Tipo assim num baião / Do Gonzaga".
Restam ainda a melancólica "Querido Diário", a triste sequência da música de Tom Jobim "Sem Você nº2", a literária e trágica "Sinhá" e o divertidíssimo samba "Sou Eu", gafieira com a participação de Wilson das Neves.

Vale celebrar a parte instrumental de Chico.
No melhor da filosofia "menos é mais", o que é encontrado são instrumentos muito bem pensados e colocados na música. Impressiona esse cuidado em faixas como "Essa Pequena", por exemplo. Grande parte do mérito deste lançamento se deve a isso.

No final de "Sinhá", última faixa do álbum, Chico canta algo que se parece com seu próprio epitáfio musical:

E assim vai se encerrar
O conto de um cantor
Com voz do pelourinho
E ares de senhor


Com Chico, o compositor nos apresenta sua mais acessível (e talvez sua melhor) coleção de músicas em muito tempo, mostrando que ainda tem muito o que mostrar, calando a boca dos que o davam como acabado e mostrando por que é sim nosso maior compositor.
Esperamos que o conto deste cantor, com voz do pelourinho e ares de senhor, ainda esteja longe, muito longe de acabar.

2 comentários:

Luis disse...

Muito preciso, senhor Brancatelli! Acho que o disco ganha de qualquer outro da safra recente por toda a costura conceitual, que entendemos vendo "Dia Voa", com Chico explicando faixa-a-faixa. Ou pode ser q eu não tenho entendido os outros :)

Gleds disse...

Eu acho tão divertido ele explorar esse "mundo novo" (pra ele, pelo menos), a internet. A música Nina é, obviamente, sobre um relacionamento à distância com a garota, que sonha em conhecer o Brasil mas não tem coragem e que gosta de conversar pela webcam.

E a citaçãozinha na Barafuda "gravei na memória mas perdi a senha..."

É TÃO bacana =)